Quando começaram os anos 80, nós, adolescentes que pensávamos em poesia no interior da Paraíba, não conhecíamos os autores paraibanos. Desconhecíamos o movimento Sanhauhá e sabíamos muito pouco do Jaguaribe Carne. Conhecíamos mais o cinema documental com as figuras de Wladimir de Carvalho, Linduarte Noronha, Machado Bittencourt, João Ramiro Neto e Ipojuca Pontes.
A pequena cidade de Areia, na região do Brejo, abrigava por essa época o seu Festival de Artes, reunindo peregrinos das artes de todo o Brasil. No ano de 82, chegava às nossas mãos alguns livros produzidos pelo Governo do Estado, sob o comando de Tarcísio Burity. A antologia Carro de Boi, a nova poesia paraibana, organizada por Juca Pontes, publicada no ano anterior, foi a primeira carta de orientação para nós.
Nela, estavam os novos. Os que faziam a poesia da Paraíba. E nós, que nos julgávamos os novos, chegáramos a cocnclusão de que não éramos nada. A Carro de Boi, todavia, não trazia autores interioranos. Estava recheada de autores radicados na capital ou em Campina Grande, a mais importante cidade paraibana naquele momento. Não havia a política de interiorização das ações culturais e tudo rumava para o litoral.
A Carro de Boi foi importantíssima mesmo assim. Lembro-me de ficar discutindo com os colegas quem era o melhor poeta, se Saulo Mendonça ou José Leite Guerra. Figuravam na antologia dois nomes que seriam conhecidos nacionalmente: Zé Ramalho, cujo Apocalypseestava reproduzido quase na íntegra, ou mesmo na íntegra, e que viria a se transformar em sucessos musicais com os nomes de Canção Agalopada e Beira Mar, Beira Mar Capítulo II e Beira Mar Capítulo Final. E Braulio Tavares, com Caldeirão dos Mitos, gravada depois por Elba Ramalho.
Eulajosé Dias de Araújo, Águia Mendes, Políbio Alves, Jomar Souto, Aldo Lopes, Marcos Agra, Marcos Tavares, Arland de Souza Lopes, José Antonio Assunção e o próprio organizador Juca Pontes formavam o time representante do esquadrão poético paraibano. Outro, Sérgio de Castro Pinto, terminou por se transformar em nome de referência por seu engajamento poético e crítico, professor da Universidade Federal da Paraíba. Mas foi a Carro de Boi que o levou para o interior.
A Carro de Boi trazia uma epígrafe de Lúcio Lins, poeta que se solidificaria na década de 90, morto em 2005, que reproduzimos como ágora, ao redor da qual elevaram-se os edifícios:
bordam-se palavras
que calam as rendeiras
quando em seu ofício
depois de finda a renda
vestem-se os poemas
em vários exercícios.
(Lúcio Lins – Dois Movimentos)